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#Artigo: O professor e a Educação do século 21
27/01/2015A chegada do livro digital e o uso crescente das
tecnologias educacionais nas salas de aula têm despertado em muitos o
sentimento de que a Educação no Brasil está chegando ao século 21. Com isso,
cada vez mais, recai sobre o Professor a necessidade de aprender a dominar
novas tecnologias para não ser considerado obsoleto e responsável pelo atraso
do sistema educacional brasileiro.
É
claro que os Professores — como qualquer outro profissional preocupado com seu
trabalho — precisam se inteirar das novidades em sua área, mas será justo
responsabilizá-los pela efetivação da Educação do século 21? Se quisermos
entender melhor as responsabilidades e os limites do trabalho do Professor
nessa questão, pode ser útil percorrer os trilhos da história do nosso sistema
educacional.
Hoje,
pode parecer natural pensar que crianças e jovens vão à Escola para estudar.
Porém essa ideia é recente em termos históricos. Foi após a Revolução
Industrial e, principalmente, após a Revolução Francesa que a Educação apareceu
como necessidade universal, laica e de responsabilidade do Estado. Dentro do
contexto de virada do século 18 para o 19, surgiram os Sistemas Nacionais de
Ensino, que, em boa medida, funcionam no mundo ocidental até hoje e cuja base é
“voltada para a transmissão do conhecimento acumulado pela humanidade e
sistematizado logicamente”, como descreve o Professor Dermeval Saviane.
Nesse
contexto, a Escola nasce e se configura como espaço fechado, com salas de aula
onde os Alunos devem permanecer sentados em fileiras, ouvindo e copiando as
informações transmitidas pelo Professor durante 50 minutos (esse foi
considerado o tempo médio capaz de atrair a atenção de um estudante na época).
Mas
hoje vivemos em outro tempo histórico e os jovens do século 21 têm uma
realidade bastante diferente da dos Alunos do passado. Vivemos em uma realidade
marcada por mudanças que se reconstroem a cada segundo: novas tecnologias,
redes sociais, bombardeio de imagens por meio da televisão, internet,
videogame, novos valores culturais, sociais e econômicos. Tanto a forma de
adquirir conhecimento quanto o conhecimento em si estão inseridos em outra
realidade, não mais estanque ou compartimentada.
Porém,
ao mesmo tempo em que a sociedade convive com as novidades, nosso modelo
educacional continua, em grande parte, atrelado às estruturas do século 19. O
Ensino, em larga escala, ainda se encontra baseado em aulas expositivas e faz
pouco uso das novidades encontradas fora dos muros da Escola. Para agravar
ainda mais a situação, pesquisas recentes com neurociências e psicologia
mostraram que o tempo de atenção de um Aluno de hoje em uma aula é de seis
minutos, quando muito, chega-se a 20 minutos.
O
Professor fica no meio do fogo cruzado: trabalha em ambiente cuja estrutura se
fundamenta nos século 19, mas lida com os jovens que vivem o século 21. Claro
que, em seu cotidiano, o Professor — formado a partir de conceitos pedagógicos
do século 20 — pode e deve lançar mão de ferramentas que permitam que as aulas
estejam mais ligadas à realidade do Aluno, como trabalho mais sistemático com
imagens, jogos (eletrônicos ou não), construção de blogues, produção de filmes
etc. São recursos que atraem os estudantes ansiosos por tarefas mais
interativas e menos contemplativas.
Mas
não adianta simplesmente o Professor ser do século 21 se a Escola como um todo
não o for. Por isso, torna-se urgente construir uma Escola que tenha como base
a sociedade deste século. Uma Escola que funcione amparada nas necessidades e
na realidade de seu entorno; onde os Alunos se sintam desejosos de participar
por verem suas realidades e sonhos discutidos e inseridos no programa Escolar;
em que o espaço de circulação e aprendizagem não fique restrito à sala de aula;
onde o mobiliário seja pensado para a nova realidade; onde a arte e o esporte
sejam verdadeiramente recurso pedagógico; onde as diferenças sejam valorizadas
e respeitadas e onde o erro seja apenas uma das etapas da aprendizagem.
GISLANE
AZEVEDO
Historiadora, é presidente da Associação Brasileira dos Autores de Livros
Educativos (Abrale)
Artigo publicado originalmente no jornal Correio Braziliense (DF)