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Apostas empresariais na retomada econômica do Brasil

08/02/2017

Investimento estrangeiro direto atinge recorde de US $ 15,4 bilhões no mês em meio à esperança de reformas

Joe Leahy em São Paulo, para o Financial Times

Quando Hanno Kirner, diretor-executivo de estratégia da Jaguar Land Rover, visitou São Paulo para o recente salão do automóvel na cidade, ele desconsiderou preocupações com a economia brasileira.

Ainda que o maior país da América Latina esteja sofrendo com a pior recessão em mais de um século, o que levou a uma queda de 20% nas vendas de carros em toda a indústria no ano passado, a montadora de luxo está aumentando a produção de uma nova fábrica de 240 milhões de libras esterlinas aberta no Rio de Janeiro no ano passado.

“O Brasil é uma economia forte e, uma vez que se livre de seus problemas, voltará a ter um crescimento econômico”, afirmou Kirner. “O País tem recursos. Tem uma população jovem e dinâmica. Tem tudo a longo prazo.”

A Jaguar Land Rover não está sozinha. Mesmo com a contração da economia brasileira pelo segundo ano consecutivo em 2016, o investimento direto estrangeiro (IED) em dezembro atingiu US$ 15,4 bilhões, um recorde para o mês, de acordo com o Banco Central. Isso elevou o investimento direto estrangeiro total para o ano a US$ 78,9 bilhões, um aumento de 6% com relação a 2015.

Esse resultado vem apesar de um desempenho econômico sombrio. Um levantamento feito pelo Banco Central com economistas no final de 2016 previa uma retração da economia em 3,49% durante o ano.

Os economistas dizem que os investidores de longo prazo continuam interessados porque, como uma das maiores economias de mercado emergentes do mundo, o Brasil é grande demais para ser ignorado. Os investidores também estão esperançosos com uma nova onda de reformas, enfatizada pelo presidente Michel Temer em uma entrevista ao FT na semana passada, para tratar de questões estruturais de longo prazo.

“Embora a economia brasileira não esteja tão bem, é tão grande que as empresas não podem se dar ao luxo de ficar fora dela”, disse David Beker, economista da Merrill Lynch.

Os dados do IED brasileiro podem ser enganosos. Grandes investimentos individuais, como uma usina siderúrgica, podem, de repente, distorcer os dados de um mês. Um grande componente do IDE no Brasil também é composto por empréstimos interempresariais, entre empresas “onshore” e suas afiliadas “offshore”. Alguns analistas suspeitam que parte desse dinheiro está estacionado no Brasil para aproveitar as altas taxas de juros reais do país, que estão na faixa de 6 a 7 por cento.

Mas, no geral, o IDE permaneceu surpreendentemente sólido, afirmaram os analistas, o que ajudou a fortalecer a moeda brasileira, o real, em relação ao dólar, em cerca de 23% nos últimos 12 meses. “O ano passado foi muito importante para o IDE e a conta corrente melhorou significativamente”, disse Beker.

Economistas dizem que uma das razões pelas quais os investidores de longo prazo estão preparados para olhar além dos números ruins do PIB e continuar colocando dinheiro no Brasil é que eles veem a crise como cíclica e não como um colapso estrutural.

Acontecimentos políticos ajudaram a tornar as perspectivas mais positivas para este ano. Após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff no ano passado, o governo pro-negócios de seu sucessor, Michel Temer, avançou com ambiciosas reformas.

Uma delas, uma lei que visa a limitar os aumentos reais das despesas orçamentárias a zero, já passou pelo Congresso. A outra reforma mais dura, um projeto de lei para fazer com que a previdência seja sustentável, enfrenta uma batalha no Congresso este ano, mas está fazendo progressos.

A economia também deve receber um impulso de curto prazo por conta dos baixos estoques da indústria, que atingiram o fundo do poço e precisarão ser renovados neste ano. Além disso, o Banco Central iniciou um agressivo ciclo de flexibilização das taxas de juros, uma vez que a inflação caiu dos altos patamares registrados sob o governo de Rousseff para dentro da meta do Banco Central.

“Passamos o pior do ciclo”, afirmou Marcos Casarin, da Oxford Economics.

Casarin prevê um crescimento de 0,4% para 2017 conforme a economia se livra da ressaca da longa recessão e se fortalece ainda mais em 2018.

O otimismo sobre o futuro de longo prazo do Brasil também é compartilhado por investidores estratégicos além da Jaguar. No final do ano passado, o executivo-chefe da Shell, Ben van Beurden, realizou uma reunião de analistas no Brasil para mostrar os investimentos da empresa em descobertas de petróleo ultraprofundo na costa do Rio.

Enquanto isso, a empresa chinesa de energia elétrica State Grid conquistou o controle de sua maior contraparte no setor privado brasileiro, a CPFL Energia, por R$ 17,4 bilhões. E a estatal petrolífera Petrobras vem cedendo ativos e vendendo-os a investidores internacionais.

O sentimento positivo em São Paulo pode ser interrompido quando o Congresso retornar do recesso no próximo mês e o Supremo Tribunal Federal começar a processar uma pilha de investigações sobre políticos que ocupam cargos públicos relacionadas à corrupção na Petrobras. Muitos desses políticos pertencem ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro de Temer, o que vai alimentar a incerteza política. Mas o IDE deverá superar a tempestade novamente este ano.

“O Brasil sempre será volátil – a diferença é que de 2011 até o ano passado, fomos voláteis em uma tendência de queda. A partir de agora, seremos voláteis em uma tendência ascendente “, disse Casarin.