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Entrevista com o responsável técnico pela Nota FUG sobre a emergência econômica no RS
27/05/2024Em resposta aos graves impactos econômicos causados pelas recentes enchentes no Rio Grande do Sul, a Fundação Ulysses Guimarães (FUG) divulgou a Nota Técnica “RS: Estratégia de Recuperação e Regeneração Econômica”. O documento, elaborado sob a orientação do economista e consultor da FUG Gustavo Grisa, enfatiza a necessidade de um plano abrangente e arrojado para enfrentar os desafios econômicos de curto, médio e longo prazo decorrentes da catástrofe.
Grisa é economista com mestrado em Negócios Internacionais pela Thunderbird School of Global Management e formação executiva na Universidade de Cambridge. Foi analista de risco político para a América Latina nos EUA. Experiência de liderança em economia, estratégia e relações institucionais no Sistema CNI, Brasil Telecom e Vale.
Consultor e líder de projetos em inovação pública e estratégia governamental e institucional, formulação de programas de governo e atração de investimentos internacionais, Grisa também foi coordenador-geral do plano Caminhos do Rio Grande, da Fundação Ulysses Guimarães (2021), coordenador técnico do projeto RS 2030 da Famurs (2017) e autor do livro RS-Sem Medo do Futuro (2009).
A Fundação Ulysses Guimarães (FUG) é uma instituição dedicada à promoção do desenvolvimento social, econômico e político do Brasil. Fundada com o objetivo de fomentar a cidadania e a democracia, a FUG atua por meio de programas de educação política, pesquisas e publicações que visam capacitar líderes e cidadãos em todo o país.
Confira os principais pontos da entrevista:
Motivação e Contexto
Segundo Gustavo Grisa, a criação da Nota Técnica foi motivada pela urgência de comunicar a complexidade e a profundidade do esforço necessário para a recuperação do estado. “Não será um esforço simples ou rápido. A economia do Rio Grande do Sul já vinha apresentando uma tendência estrutural de declínio e, com o choque do desastre recente, há um risco de agravamento ainda maior”, explicou Grisa.
Ele destacou que, sem uma estratégia robusta, a participação do estado no PIB brasileiro pode cair drasticamente, o que comprometeria a capacidade de manutenção das obrigações sociais e do setor público.
Impactos Permanentes e Temporários
A Nota Técnica também aborda os impactos econômicos permanentes das enchentes, diferenciando-os dos de curto e médio prazo. Grisa alertou que, sem uma articulação ágil e eficaz, o Rio Grande do Sul pode enfrentar um colapso macroeconômico, com agravamento das contas públicas e migração de jovens em busca de melhores oportunidades.
“No médio prazo, podemos ver uma desistência do estado como destino de investimentos, e no curto prazo, a recuperação de infraestrutura e da vida das pessoas é essencial para que o empreendedorismo local possa florescer novamente”, afirmou.
Declínio Econômico Estrutural
Desde os anos 1980, o Rio Grande do Sul vem sofrendo uma redução no seu peso dentro da economia brasileira, em grande parte devido à desindustrialização do país. “O estado, que era fortemente industrial e agrícola, não conseguiu compensar essa perda em outros setores, agravando ainda mais a situação econômica”, explicou Grisa.
Ele ressaltou que a catástrofe recente pode acelerar ainda mais esse declínio, tornando urgente a necessidade de ações de recuperação e regeneração econômica.
Recuperação vs. Regeneração
Grisa destacou a diferença entre recuperação e regeneração econômica. “A recuperação visa retomar as atividades pré-existentes, enquanto a regeneração busca expandir e diversificar a economia, trazendo novos setores e investimentos para o estado”, esclareceu.
Ele enfatizou que ambos os processos precisam acontecer simultaneamente para evitar que a recuperação seja insuficiente a longo prazo.
Atração de Investimentos
Para atrair novos investimentos, a Nota Técnica propõe a criação de um grande fundo de financiamento de crédito e a garantia de vantagens creditícias de médio e longo prazo para novos investidores. “Também é crucial a participação de agências internacionais de financiamento e a integração do estado nas cadeias produtivas de grandes grupos econômicos”, explicou Grisa.
Para o economista, o objetivo é tornar o Rio Grande do Sul um estado competitivo e atrativo para investimentos internacionais.
Governança Ampla e Inclusiva
A governança é outro ponto central do documento. Grisa destacou a necessidade de uma unidade gestora interinstitucional, com participação de entidades empresariais e setores privados, para coordenar os esforços de recuperação e regeneração.
“Essa unidade precisa ser enxuta, eficiente e comprometida, com conhecimento e trânsito nacional e internacional para mobilizar os recursos necessários”, disse.
Papel da FUG na Implementação das Estratégias
A Fundação Ulysses Guimarães desempenha um papel fundamental na formulação e promoção das estratégias delineadas na Nota Técnica. “A FUG traz esta contribuição crucial para o debate sobre a emergência econômica do Rio Grande do Sul. Esperamos que este documento sirva como um motivador para ações imediatas e efetivas”, afirmou Grisa.
Ele concluiu destacando que a colaboração entre governo, setor privado e entidades internacionais é essencial para que o estado possa se recuperar e prosperar novamente.
A Nota Técnica “RS: Estratégia de Recuperação e Regeneração Econômica” é, portanto, um chamado à ação, propondo uma abordagem multifacetada e colaborativa para enfrentar os desafios econômicos pós-catástrofe no Rio Grande do Sul.
Confira a transcrição completa da entrevista e respectivos links para os vídeos:
1. Quais foram os principais fatores que motivaram a criação da Nota Técnica “RS: Estratégia de Recuperação e Regeneração Econômica”?
“A principal motivação para a criação da Nota Técnica é a necessidade que nós temos nesse momento de deixar claro para as pessoas que o esforço de recuperação econômica para o Rio Grande do Sul, depois de tudo o que aconteceu, não será simples, banal ou de curto prazo. Há necessidade não só de recuperação, mas de regeneração econômica para contrapor o tamanho do choque ao qual a economia do Rio Grande do Sul estará agora tendo que reagir, com reflexos duradouros, durante duas décadas. Se o Rio Grande do Sul já apresentava uma tendência econômica estrutural de queda de participação no PIB brasileiro, a situação se agravou ainda mais com o desastre. Antes, estávamos em um patamar de 7,8%, 7,9%, perto de 8% de participação na economia do Brasil até os anos 2000. Atualmente, estamos em 6% a 6,2%. Projetava-se uma queda para 5,3%, 5,4% em 20 anos, mas o choque atual pode acelerar esse declínio para patamares ainda mais baixos, como 4,7%, 4,8% da economia brasileira. Isso é inadmissível, pois comprometeria a capacidade do Rio Grande do Sul de manter suas obrigações sociais e do setor público. Por isso, é necessária uma estratégia arrojada e completa, que está delineada nesta Nota Técnica.”
[Link para o vídeo https://youtu.be/kUTfcXFWYOk]
2. Poderia nos explicar quais são os impactos econômicos permanentes das enchentes no Rio Grande do Sul e como eles diferem dos impactos de curto e médio prazo?
“A preocupação da Nota Técnica é entender o impacto de longo prazo sobre a economia do Rio Grande do Sul. No longo prazo, sem uma grande reação e articulação ágil, mobilizando fundos internacionais e adotando novos padrões de gestão, o Rio Grande do Sul pode enfrentar um colapso macroeconômico significativo, com agravamento das contas públicas e migração de jovens em busca de melhores oportunidades. Isso resultaria em um estado de depressão econômica mais estabelecido, tornando o Rio Grande do Sul o estado mais pobre da região sul do Brasil. No médio prazo, haveria desistência do Rio Grande do Sul como destino de investimentos, tanto nacionais quanto internacionais, além dos próprios agentes econômicos gaúchos. No curto prazo, é essencial a recuperação da infraestrutura, incluindo energia e logística, para permitir que a vida das pessoas e o empreendedorismo local floresçam novamente. A crise traz uma oportunidade para acelerar o processo de reconversão econômica, substituindo fontes de energia e abordando a questão hídrica, por exemplo, através do transporte hidroviário e de um choque de sustentabilidade no agronegócio. Para isso, é fundamental a existência de uma unidade gestora que coordene esses esforços além dos esforços governamentais, contando com a participação de entidades empresariais e articulações nacionais e internacionais.”
[Link para o vídeo https://youtu.be/rmy_DKpZ_R8]
3. A Nota Técnica menciona uma tendência econômica estrutural declinante no estado desde 1980. Quais são as principais causas dessa tendência e como a catástrofe recente a agrava?
“O Rio Grande do Sul tem sofrido uma redução de seu peso dentro da economia brasileira, principalmente a partir dos anos 80, devido a vários fatores, incluindo a desindustrialização do Brasil. O estado era fortemente industrial, com um complexo agrícola e agroindustrial significativo. No entanto, com o Brasil abandonando sua posição de país industrial, o Rio Grande do Sul foi mais afetado do que outros estados. Além disso, sua geografia periférica, diferente de São Paulo, que está no centro de tudo, contribuiu para que o estado não conseguisse compensar a perda industrial com outros setores. A crise econômica dos anos 80 atingiu o Rio Grande do Sul de forma particularmente severa, agravando as contas públicas. O estado tem uma economia muito pequena para a demanda social e a estrutura pública que possui, como um carro muito grande com um motor muito pequeno. Medidas econômicas sensatas têm sido tomadas desde o final dos anos 90, tentando reverter isso através de investimentos e substituição da matriz produtiva. A catástrofe de maio de 2024 acelera esse declínio, exigindo ações rápidas para evitar uma deterioração ainda maior da qualidade de vida e das finanças públicas. É preciso expandir a economia do Rio Grande do Sul através da recuperação das atividades existentes e da atração de novos setores e investimentos.”
[Link para o vídeo https://youtu.be/GdmC6UKEUXI]
4. O conceito de “regeneração” econômica é fundamental no documento. Como a regeneração difere da simples recuperação econômica, e quais são os seus principais objetivos?
“A recuperação econômica visa retomar as atividades que existiam, restabelecendo um Rio Grande do Sul funcional em energia, transportes, infraestrutura e negócios. Significa trazer a economia do estado para o máximo nível possível dentro dos fatores de capital e trabalho disponíveis atualmente. A regeneração, por outro lado, busca expandir e diversificar a economia do estado, abrindo espaço para novos setores e investimentos que não existiam antes. Isso inclui trazer novas empresas e negócios, especialmente internacionais, e aumentar a competitividade do estado. A regeneração é um passo além da recuperação, buscando um crescimento econômico mais sustentável e diversificado no longo prazo.”
[Link para o vídeo https://youtu.be/rXdURhOPEvY]
5. Quais são as principais propostas da Nota Técnica para atrair novos investimentos e financiar a regeneração econômica do Rio Grande do Sul?
“Para atrair novos investimentos, a Nota Técnica sugere a criação de um grande fundo de financiamento de crédito, garantido pelo estado e por fontes internacionais. Seriam oferecidas vantagens creditícias de médio e longo prazo para novos investidores, além de incentivos para empresas já estabelecidas no Rio Grande do Sul expandirem suas operações. Também é fundamental atrair agências internacionais de financiamento, como o Banco Mundial e o BID, para participar desse esforço. O estado precisa se integrar nas cadeias produtivas de grandes grupos econômicos nacionais e internacionais, tornando-se um destino competitivo e atraente para investimentos. A regeneração econômica requer uma abordagem multifacetada, com participação de diversas partes interessadas e uma governança eficiente para coordenar e implementar as ações necessárias.”
[Link para o vídeo https://youtu.be/luN4YjyrbxE]
6. Como a governança da recuperação e regeneração econômica deve ser estruturada, segundo a Nota Técnica, para garantir a eficácia das medidas propostas?
“A governança é um ponto crucial. A Nota Técnica propõe a criação de uma unidade gestora interinstitucional, com participação de entidades empresariais e setores privados, além de representantes do governo. Esta unidade deve ser enxuta, eficiente e comprometida, com conhecimento e trânsito nacional e internacional para mobilizar os recursos necessários. Ela será responsável por coordenar os esforços de recuperação e regeneração, garantindo que as ações sejam executadas de forma integrada e eficiente. A participação de diferentes stakeholders é essencial para que as decisões sejam tomadas de maneira inclusiva e representativa, garantindo o sucesso das medidas propostas e a atração de investimentos para o estado.”
[Link para o vídeo https://youtu.be/_OvvzSabfy8]
7. Qual é o papel da Fundação Ulysses Guimarães na implementação das estratégias delineadas na Nota Técnica, e quais são os próximos passos?
“A Fundação Ulysses Guimarães (FUG) tem um papel fundamental na formulação e promoção das estratégias delineadas na Nota Técnica. A FUG está comprometida em contribuir para o debate sobre a emergência econômica do Rio Grande do Sul, fornecendo insights e propostas concretas para enfrentar os desafios atuais. Os próximos passos incluem a articulação com o governo estadual e federal, setores empresariais e entidades internacionais para implementar as medidas propostas na Nota Técnica. A colaboração entre diferentes setores é crucial para garantir que o Rio Grande do Sul possa se recuperar e prosperar novamente, tornando-se um estado mais competitivo e atrativo para investimentos.”
[Link para o vídeo https://youtu.be/OO_0qw5tDJQ]