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‘Estamos tomando decisões que ninguém teve coragem’, diz Moreira Franco

28/02/2018

Ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência diz que intervenção era único caminho

 

 

por Geralda Doca

BRASÍLIA — O Estado do Rio de Janeiro viveu nesta terça-feira o anúncio das primeiras medidas da intervenção na segurança pública. Em entrevista ao GLOBO, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, afirmou que a ação era o único caminho para o Rio de Janeiro, destacando que o carnaval representou o ápice da crise na segurança. Segundo Moreira, o governo precisou tomar “decisões que ninguém teve coragem de tomar”. Leia a entrevista completa com o ministro-chefe:

O que vai mudar na segurança do Rio até o fim do governo?

Quando eu tinha 41 anos de idade e fui candidato a governador, em 1986, o nível de organização do crime organizado não era tão alto, mas já era algo que afrontava a população. Naquela época, eu acreditava que o Estado tinha capacidade e aparelhos de segurança capazes de inibir a ação daqueles que buscavam a criminalidade. Aos 73 anos, vivi muito, a gente aprende e perde muitas ilusões. Uma das que eu perdi é a de que o poder público é onipresente e onipotente. Tem deficiências. Não se acaba com a violência, mas esse padrão que está se impondo no país é intolerável.

 

A intervenção no Rio vai dar certo?

O resultado será muito positivo. Estamos tomando decisões que ninguém teve coragem de tomar. A situação da segurança no Rio se agravou. No carnaval, foi o ápice, inacreditável o grau de esgarçamento do poder público. Não havia outro caminho. Tínhamos três hipóteses: fazer uma intervenção geral, que significaria retirar o governador; parcial, que entrava na causa do problema; ou não fazer nada. Se fosse fazer uma intervenção total em ano de eleição, haveria uma leitura inevitável de que ela seria eleitoral. Foi uma alternativa baseada em discussões técnicas.

 

Quando aconteceu essa discussão técnica?

 

Começou na terça-feira de carnaval, quando se discutiu o arcabouço jurídico, e terminou na quinta-feira, quando a decisão foi tomada.

 

Mas a decisão foi às vésperas da votação da reforma da Previdência, para a qual o governo sabia que não tinha votos.

Você acha que um presidente da República que enfrentou duas denúncias na Câmara vai colocar um problema deste tamanho em função de ter ou ter votos para a Previdência? Há uma fragilidade analítica, o amesquinhamento do processo é brutal, as pessoas sempre acham que o outro tem segundas intenções. Não tem. Você acha que somos irresponsáveis, pegar uma situação grave para esconder que não tinha votos para a Previdência.

 

Mas a pauta do governo mudou de uma hora para outra.

Mudou porque tinha que mudar. Não havia alternativa e o governo não teve medo de enfrentar o problema de maior complexidade, de maior delicadeza, do que uma eventual vitória ou derrota na Previdência. Também não teve receio de dizer que o compromisso com a Previdência continua.

 

Qual é o risco dessa intervenção?

Não sou militar. Essa pergunta é de natureza operacional e técnica, eu acho que não tem risco. A situação chegou ao limite, existe uma experiência acumulada não só no Rio, como fora. O aparelho policial, em função de eventos como Copa do Mundo, Olimpíadas no Rio, tem tecnologias, que, se usadas de maneira coordenada, permitem obter grandes resultados. Por exemplo, os jornais deram que os soldados estavam tirando fotografia das pessoas. Não era fotografia. Aquilo é um aplicativo que está conectado a um centro de operações, em que você mostra o seu documento, sua foto, e lá no centro vai dizer se você é você mesmo. É um aplicativo de fiscalização. Temos que introduzir nessa luta esses avanços tecnológicos.

 

Em que o novo ministério vai ajudar?

Com a criação do Ministério de Segurança Pública, vamos avançar porque teremos foco e vamos organizar um sistema que incluiu município, estado e União. De outro lado, caberá ao novo ministério revisitar o conceito de segurança pública no Brasil no ponto de vista ideológico. Como ficamos muito tempo em regimes autoritários, esses aparelhos foram usados para outros fins, políticos, gerou um preconceito, uma desconfiança muito grande. Essa questão é fundamental para que possamos avançar, fazer com que a ideia de sociedade democrática de respeito aos direitos humanos seja para todos e não para alguns. É preciso desmistificar essa questão do mandado coletivo, você consegue tecnologicamente saber que um sequestrado está em um edifício, mas não consegue saber o andar. O que tem de fazer é ir à justiça e dizer mandado de busca e apreensão com área limitada e tem que explicar. Você não pode, em cima de uma questão ideológica, inibir o combate ao crime.

 

O presidente Michel Temer pode ser candidato?

Isso é outro problema. Não vou falar disso agora, não tem nada a ver com segurança.

matéria originalmente publicada no jornal O GLOBO, no dia 28 de fevereiro de 2018.

Link da matéria: https://goo.gl/JmQ6CM