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Por uma democracia eficiente

02/09/2013

Na
história republicana do Brasil, sempre tivemos crise institucional. A cada
período de vigência de Constituição, tivesse ela ou não conteúdo democrático,
crises se sucediam.

Foi
assim em 1891, logo depois do decreto nº 1, de 15 de novembro de 1889, que
proclamou a Republica. Inspirada nos Estados Unidos, a Constituição era
liberal, mas não evitou as crises até 1930: Guerra de Canudos, Revolta da
Chibata, Guerra do Contestado, a Coluna Prestes.

Em
1930, inaugurou-se sistema declaradamente ditatorial que perdurou até 1934,
quando houve intervalo com a Constituição exigida pelo país. Em 1937, edita-se
nova Constituição de feitio autoritário e centralizador. O presidente Getúlio
Vargas legislou por meio de decretos-leis até 1945, com os mais variados
movimentos insurrecionais.

Sempre
crise institucional. Veio a Constituição de 1946, com dizeres democráticos. Mas
a crise institucional não terminou. Retornou, pela via eleitoral, Getúlio
Vargas. Mesmo com a vigência de critérios democráticos derivados da
Constituição de 1946, os conflitos não diminuíram e tinham repercussão nas
instituições e na sociedade.

Chegou-se
ao suicídio de Vargas e sucessivas crises institucionais. Não houve paz interna
até a eleição de Juscelino Kubitschek, cujo governo também enfrentou sedições.

Veio
a eleição de Jânio Quadros, que renunciou em seis meses. Nova crise, portanto,
a que se seguiu outra: a posse ou não de João Goulart, vice-presidente. Para
que Jango pudesse assumir, engendrou-se o parlamentarismo, com a geração de
grande instabilidade política e social. Durou pouco.

Em
1963, retornou-se ao sistema presidencialista. Jango enfrentou crise após
crise. Sobreveio o golpe de 31 de março de 1964. Findava-se o período regido
pela Constituição de 1946 e iniciava-se outro, cuja regência era dada pelos
atos institucionais. Todos centralizando o poder na figura do presidente da
República. Especialmente o AI-5 de 1968, apesar de havermos editado
Constituição em 1967.

Os
conflitos se sucediam. Foram tantas as crises que o povo exigiu o retorno à
democracia, não sem antes termos passado por várias perturbações
institucionais.

Vejam
que remarco e insisto na expressão “crise institucional”.

A
palavra merece gradação. A crise pode ser administrativa quando há má condução
das atividades públicas. Pode ser econômica quando os critérios regentes da
economia geram perdas para o país. Pode ser política quando, na democracia, o
Executivo não tem suficiente apoio no Parlamento. E pode ser institucional. As
primeiras são contornáveis. A última é a mais grave porque, no geral, exige
nova ordem constitucional. Ou seja, novo Estado. Foi o que aconteceu em 1934,
1937, 1946, 1964/67.

Em
1988, a Assembleia Constituinte produziu o Estado brasileiro atual. Na
Constituição, estão preceitos do liberalismo ao lado de direitos sociais. Dou
como exemplo o direito à alimentação e à moradia. Milhões de brasileiros
ascenderam socialmente e atendeu-se ao princípio da “dignidade
humana”.

Como
todos esses preceitos vêm sendo aplicados, não temos crise institucional.
Diferentemente do passado, e embora a Constituição Federal esteja completando
25 anos, não se esboça necessidade de modificação institucional.

Recentemente,
convivemos com movimento popular nas ruas, de enorme dimensão. Embora alguns se
incorporassem a esses movimentos para gerar crise (é exemplo o caso dos
depredadores do patrimônio público e privado), o país não se abalou. Ao
contrário.

Os
Poderes do Estado atenderam ao clamor popular tomando mais rapidamente série de
medidas exigidas por aqueles movimentos.

Rompemos,
assim, com o ciclo histórico brasileiro que fazia com que, a cada 20, 25 anos,
tivéssemos de recriar o Estado. Este, ancorado nos preceitos da Constituição,
continua forte e sobranceiro.

Temos
sido capazes de evitar crise institucional pela aplicação dos dispositivos
constitucionais. Afinal, o Direito existe para regular as relações sociais em
busca da harmonia entre os vários setores da nacionalidade. Em outra palavra: o
Direito estabelece quais são as regras do jogo. Desde que se as obedeça, não há
por que mudar.

Explico
agora as razões do movimento popular que ocupou as ruas brasileiras. Embora
tenha demonstrado vigor, não abalou as instituições do Estado. Importante, em
tudo, é que não nos desviemos dos critérios democráticos fixados na
Constituição Federal.

Relembro:
o Estado brasileiro nasceu juridicamente com a Constituição de 1988. O texto
foi escrito sob o efeito das liberdades conquistadas. Daí porque se adotaram os
preceitos da democracia liberal.

Sublinho
que a democracia depois da Constituição de 1988 passou por três fases.

A
primeira foi a democracia liberal –quando as liberdades individuais e as
liberdades públicas foram não só enfatizadas no texto constitucional, mas
aplicadas com grande empenho.

Seguiu-se
a democracia social, quando aqueles que usufruíam das liberdades passaram a
perceber que elas por si só não eram suficientes e demandaram os direitos
sociais, o atendimento às necessidades mais básicas. E essa fórmula democrática
permitiu extraordinária ascensão social de 35 milhões de pessoas à classe
média.

Ora,
essa nova classe média passou a exigir não apenas aquilo que já havia conquistado,
mas outra fórmula de democracia. A essa terceira eu chamo de democracia
eficiente. Ou seja, passou-se a exigir maior qualidade nos serviços públicos
prestados ao povo. Até porque quem não tinha carro e o adquiriu leva horas para
chegar ao trabalho. Quando entra no metrô, em ônibus ou aviões, encontra-os
superlotados e incapazes de lhe oferecer um mínimo de conforto e dignidade.
Passou-se a exigir eficiência. E essa busca fez com que muitos milhares de
pessoas fossem às ruas.

Sem
a compreensão das fases pelas quais passou a democracia brasileira, fica
difícil entender as razões do movimento popular.

Ao
mesmo tempo em que se exigiam serviços públicos eficientes, passou-se a exigir
também um comportamento político eticamente inatacável do homem público.

A
demanda pela eficiência democrática exigia também reformulações no sistema
político. Geraram, por isso, movimentações no Executivo e no Legislativo para
dar agilidade a processos antes apenas cogitados. Agora, eles passam a ser
aplicados. Na democracia que emergiu das manifestações, a voz dos manifestantes
não era rouca, mas límpida. E cobra maior eficiência de seus governantes.

Note-se:
houve grande movimentação e agitação social, mas nenhum abalo institucional.
Volto a dizer: as razões da estabilidade institucional e da adequação social às
realidades constitucionais derivam exatamente da obediência estrita aos padrões
jurídicos fixados pela Constituição Federal.

Portanto,
devemos saudar este momento em que, sem embargo das queixas nas ruas do país, o
Estado brasileiro continua funcionando com pleno vigor institucional.