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[ARTIGO] Inteligência Artificial: uma introdução ao tema

08/02/2024

Há momentos angulares na História humana. Alguns chamam isso de janela de oportunidade, outros de ponto de inflexão. Há quem diga – como já ouvi, algum tempo atrás, em uma palestra do TED – que são átimos de transição.

Na verdade, o que se quer, com tais expressões, é dizer que em determinadas fases da nossa evolução política, científica, econômica, tecnológica e comportamental, há fatos que, mesmo que não percebamos imediatamente, são tão relevantes,  têm tanta influência na vida contemporânea e futura, que se tornam ponto de partida de verdadeiros ciclos revolucionários.

A descoberta do átomo, por exemplo: seu primeiro ponto de inflexão foi com a definição filosófica de Demócrito: o átomo como a mais ínfima divisão a que a matéria pudesse ser submetida. Daí o sentido da palavra: átomo é o que não pode mais ser dividido.

De Demócrito, há mais de dois mil anos, a John Dalton, no século 19, até Max Planck. Cada um plasmou um emblemático momento de mudança. A crise da Ciência e a revisão drástica da mecânica newtoniana, o advento da teoria quântica, todos são momentos de virada que marcam definitiva e indelevelmente a sua época: da Antiguidade ao início do século 20.

O primeiro computador pessoal, que Steve Jobs deu à luz em 1984; o nascimento do Windows, obra-prima de Bill Gates, que conseguiu separar software e hardware e produzir a mais fantástica expansão industrial e comercial de uma máquina, o computador pessoal, remexendo em tudo que se conhecia até então; o advento do smartphone, novamente com o gênio Jobs, o pequeno telefone celular que se tornou alavanca de um novo mundo, nos anos iniciais do século 21. Tudo isso nos faz ver que há descobertas, inovações, ideias, invenções que acabam se constituindo em elementos catalisadores de uma nova era.

Companheiros: com as considerações acima, pretendo apenas trazer à reflexão a importância e o impacto de uma grande inovação tecnológica. Uma invenção que irá afetar profundamente nosso modo de viver e que deverá se tornar o grande ponto de inflexão dos dias atuais: a IA, a Inteligência Artificial.

A inteligência artificial está presente em grande parte dos dispositivos digitais que facilitam – e direcionam – o nosso modo de viver já há bastante tempo. O processamento de dados do meu primeiro laptop, que tinha 20 MB de memória total e  istema operacional DOS da Microsoft, lá por 1990, era um mosquito diante da gigantesca capacidade de processamento das máquinas atuais. É justamente essa capacidade de processar um imenso número de dados que torna as máquinas de hoje capazes de processar aplicativos de inteligência artificial. E ela está presente já em quase tudo que acessamos.

Mas…se a inteligência artificial já é tão “antiga”e “comum” em nossas vidas, o que faz com que ela agora tenha um impacto de mudança tão avassalador, daqui para os próximos anos? É que agora, a IA se tornou acessível a uma grande massa de pessoas, em quase todo o mundo, aqueles que têm conhecimento e habilidade para utilizá-la. Na escola, no trabalho, na arte, na ciência, no esporte, na moda, no comércio, na indústria, na agricultura, na gestão de empresas, na gestão pública, isto é, em quase todos os campos de atividade humana. A inteligência de um gestor pode ser supermultiplicada em uma tomada de decisão, porque poderá ter diante de si todas as variáveis em poucos segundos. A criatividade de um escritor pode ser aumentada exponencialmente, tais os elementos de inspiração que poderá captar. O ChatGPT4 e seus similares tornaram isso possível – para quem souber usá-los.

A revolução do Twitter, do Facebook, do Whatsapp, dos smartphones vai parecer quase brincadeira de criança perto disso. Possibilidades infinitas, mudanças ilimitadas, futuro inimaginável. Eis o que nos é reservado, eis o que é reservado a essa geração, amigos da Fundação Ulysses Guimarães.

Em muitos ambientes de debate acadêmico, científico ou político o que mais se discute é a possibilidade de que a inteligência artificial da máquina possa suplantar a inteligência do ser humano e vir a dominá-lo, em um futuro não muito  distante.  Não considero esse foco do debate uma perda de tempo nem uma insensatez. Não é um absurdo total supor que no futuro um grande computador poderá governar a todos nós. É algo bastante remoto, no entanto. É uma controvérsia  que teremos tempo e oportunidade de acompanhar e monitorar, e tomar providências de controle, se for necessário. A ciência tem feito isso com as células-tronco, por exemplo, há várias décadas.

Há, no entanto, ameaças maiores, em um futuro muito próximo, senão imediato. Uma dessas ameaças é a possível utilização da IA para gerar imagens manipuladas e fraudes, mormente no campo político, o que poderá vir a se tornar um novo elemento de produção em massa de fake news e de desestabilização das instituições.  A questão mais dramática, no entanto, meus colegas da FUG, a meu ver, não será o poder da máquina em si, de produzir mensagens falsas ou de exercer controle sobre os humanos que a operam. A questão mais dramática é que, mantidos os parâmetros sociais e econômicos atuais, a inteligência artificial poderá produzir um efeito socialmente devastador, porque fará com que se torne cada vez maior a diferença entre aqueles que saberão usá-la e aqueles que não terão nem acesso nem conhecimento para isso.

Neste mundo em que já é tão difícil estancar os fatores sociais, econômicos e tecnológicos que geram as desigualdades, a Inteligência Artificial poderá vir a ser um mecanismo de grande ampliação da distância social e econômica entre excluídos e integrados. Esse será, sem dúvida, o grande enigma desta primeira metade do século e essa é a questão mais grave e mais preocupante, em minha opinião. Poucos de nós têm condições, no estágio em que nos encontramos, de dar uma resposta ou de vislumbrar uma saída para esse labirinto.

Entre grandes avanços e reais ameaças, mais uma vez teremos de por à prova a nossa capacidade de promover equidade e justiça em um mundo cheio de mudanças que nem sequer conseguimos avaliar ou imaginar.

Autores José Fogaça, ex-senador e presidente do Conselho Editorial e de Formação Política da FUG